Levado ontem para a carceragem da Polinter, José Roberto Foto: Severino Silva / Agência O Dia
Fonte O DIA/ POR FRANCISCO EDSON ALVES
Rio - Aos prantos e dizendo-se arrependido, José Roberto Vicente de Oliveira Júnior, 20 anos, que esfaqueou os pais no apartamento da família, na Tijuca, em surto causado pelo uso de cocaína na noite de domingo, foi levado ontem à carceragem da Polinter. Antes, com dificuldade para falar, ele perguntou várias vezes pela mãe e afirmou ter chegado “ao fim da linha”. “Virei um monstro”, desabafou. A mãe, a dona de casa Iracema Magalhães Costa Oliveira, 52, que teve fígado e estômago perfurados, está no CTI do Hospital do Andaraí. O pai, o advogado e contador José Roberto Vicente de Oliveira, 50, recebeu alta, com ferimentos leves nos braços pela tentativa de socorrer a mulher.
O DIA: Você lembra o que aconteceu?
José Roberto: Mais ou menos. Lembro de ter pego uma faca na cozinha, de ter discutido com minha mãe e de ter agredido meus pais depois. Mas não consigo lembrar o motivo.
Não seria por que você queria dinheiro para comprar drogas?
Acho que foi isso mesmo. Já tinha cheirado seis papelotes de cocaína (quatro de R$ 10, um de R$ 15 e outro de R$ 5), mas queria mais droga. É incrível.
Está arrependido do que fez?
Claro. Como está minha mãe? Ela morreu? Pode falar? Meu pais sempre foram carinhosos e compreensivos comigo. Espero que eles fiquem bem.
Já se encontrou com o seu pai?
Ele esteve aqui depois que saiu do hospital. Ele só me abraçou longamente, sem falar nada. Sei que ele me entende. Não fui eu que fiz isso com eles. A droga me transformou num monstro. Hoje, o único filho deles virou um monstro, drogado e preso. Cheguei ao fim da linha.
Como você espera se livrar das drogas?
Comecei a fumar maconha com 14 anos e, aos 16, também comecei a cheirar cocaína. As drogas acabaram com minha vida. Abandonei a faculdade de Direito no segundo período porque usava o dinheiro da mensalidade para comprar drogas. Não consigo largar o vício. Já fui internado numa clínica em Santa Teresa, frequento grupo de Narcóticos Anônimos e tomo medicamentos pesados. Mas não consigo me livrar da dependência. É um pesadelo sem fim. Preciso de um tratamento. Não sei se vou ter forças para começar do zero.
Você já havia agredido seus pais?
Discutimos várias vezes por causa do meu vício, mas nunca tinha chegado a esse ponto. Já tinha visto situações extremas nos jornais, mas jamais achava que fosse acontecer comigo. Até agora não consigo acreditar que fiz isso com meus pais.
Como você conseguia dinheiro?
Roubando coisas dentro de casa e vendendo. Vendi vários celulares, roupas, tênis, relógios, objetos de decoração do apartamento e até uma batedeira de bolo da minha mãe. Ganhei um Palio dos meus pais, que penhorei por diversas vezes, por causa de dívidas com traficantes. Acabei vendendo para quitar o que devia ao tráfico. Ultimamente, estava trabalhando como office boy para meu pai, que tentou me ajudar dessa forma.
Que problemas a droga já lhe causou?
Às vezes consumia drogas e não conseguia voltar para o minha casa. Certa vez fiquei três dias perambulando ao relento, como um mendigo, sem comer, passando sede e frio. Mas nunca tinha ido parar numa delegacia.
Você sabia que pode pegar de 12 a 30 anos de prisão por tentativa de homicídio qualificado (por motivo fútil)?
Agora sei que vou ter que assumir as consequências. Só estou pensando na saúde dos meus pais no momento.
Quando encontrar com sua mãe, o que pretende dizer a ela?
Não sei nem o que dizer à minha mãe . Só quero abraçá-la, pedir desculpas. Dizer que não fui eu que fiz esse mal a ela. Não tenho coragem de maltratar ninguém, muito menos minha mãe.
Foto: Arte O Dia
Pai foi com filho pagar dívida com traficantes
Em depoimento na 19ª DP (Tijuca), o advogado José Roberto Vicente de Oliveira contou o drama que passou no domingo. Segundo ele, no meio da tarde, o rapaz ligou pedindo R$ 35, que seriam o complemento de R$ 60 para pagar um traficante no Morro do São Carlos, no Estácio, com quem havia comprado papelotes de cocaína.
“Dei o dinheiro e ainda o levei ao morro para que pagasse a dívida”, contou José Roberto. Já de volta ao apartamento da família, o advogado disse que conversou com o filho, alertando-o para a necessidade de uma nova internação, na tentativa de ajudá-lo a se livrar do vício. “Em seguida, o deixei jogando videogame no quarto. Pouco depois, ouvi os gritos de Iracema pedindo socorro”, afirmou.
Diante do filho armado com uma pequena faca de cozinha, José Roberto disse que tentou ajudar a mulher, mas acabou sofrendo ferimentos nos braços também. Vizinhos acionaram a PM, que prendeu o jovem em flagrante. A mãe do rapaz passou por cirurgias para conter hemorragias, está sedada e respira com ajuda de aparelhos.
Arrependimento e grave depressão
Especialista no tratamento a usuários de drogas, o psiquiatra Gabriel Bronstein afirma que o arrependimento também é comum em situações como a de José Roberto Júnior. “Ele pode não ser psicopata, que mata por matar. Mas talvez teve um surto psicótico, que não é obrigatório, mas acontece com usuários de cocaína”, avalia.
Maria Tereza de Aquino, do Núcleo de Estudos e Pesquisas em Atenção ao Uso de Drogas (Nepad) da Uerj, concorda: “Pelo que deduzo, ele não é psicopata. E o remorso, com a crise de abstenção, pode levá-lo à grave depressão”, avalia ela, que lamenta o baixo número de centros públicos para tratamento da dependência química na capital.
Na avaliação de Gabriel Bronstein, agora que o jovem está preso, uma das preocupações das autoridades deverá ser em manter uma vigilância constante sobre ele. Motivo: afastar o risco de que o rapaz tente o suicídio. “Essa é a conduta mais comum nesses casos, por isso ele deve ser colocado numa cela bem protegida, sem nenhum material que possa usar como instrumento para se matar”.
Poucos centros públicos para tratamento do vício
A cidade do Rio só tem dois Centros de Atenção Psicossocial Álcool-Drogas (CAPS-AD) da prefeitura e um do governo estadual, além de 70 ambulatórios na rede municipal e 200 leitos em clínicas conveniadas com o estado. No Telessaúde (3523-4025) é possível obter endereços.
Por mês, cerca de 600 usuários são atendidos nos dois centros municipais. A abstinência total dos pacientes atinge apenas 30%. Na rede estadual, a Secretaria de Saúde não informou percentual, mas ressalta que o índice de abandono do tratamento por parte dos pacientes é alto.
Os dependentes químicos recebem gratuitamente os mesmos medicamentos ministrados em consultórios de psiquiatria e suas famílias participam de todas as etapas do tratamento.
O DIA: Você lembra o que aconteceu?
José Roberto: Mais ou menos. Lembro de ter pego uma faca na cozinha, de ter discutido com minha mãe e de ter agredido meus pais depois. Mas não consigo lembrar o motivo.
Não seria por que você queria dinheiro para comprar drogas?
Acho que foi isso mesmo. Já tinha cheirado seis papelotes de cocaína (quatro de R$ 10, um de R$ 15 e outro de R$ 5), mas queria mais droga. É incrível.
Está arrependido do que fez?
Claro. Como está minha mãe? Ela morreu? Pode falar? Meu pais sempre foram carinhosos e compreensivos comigo. Espero que eles fiquem bem.
Já se encontrou com o seu pai?
Ele esteve aqui depois que saiu do hospital. Ele só me abraçou longamente, sem falar nada. Sei que ele me entende. Não fui eu que fiz isso com eles. A droga me transformou num monstro. Hoje, o único filho deles virou um monstro, drogado e preso. Cheguei ao fim da linha.
Como você espera se livrar das drogas?
Comecei a fumar maconha com 14 anos e, aos 16, também comecei a cheirar cocaína. As drogas acabaram com minha vida. Abandonei a faculdade de Direito no segundo período porque usava o dinheiro da mensalidade para comprar drogas. Não consigo largar o vício. Já fui internado numa clínica em Santa Teresa, frequento grupo de Narcóticos Anônimos e tomo medicamentos pesados. Mas não consigo me livrar da dependência. É um pesadelo sem fim. Preciso de um tratamento. Não sei se vou ter forças para começar do zero.
Você já havia agredido seus pais?
Discutimos várias vezes por causa do meu vício, mas nunca tinha chegado a esse ponto. Já tinha visto situações extremas nos jornais, mas jamais achava que fosse acontecer comigo. Até agora não consigo acreditar que fiz isso com meus pais.
Como você conseguia dinheiro?
Roubando coisas dentro de casa e vendendo. Vendi vários celulares, roupas, tênis, relógios, objetos de decoração do apartamento e até uma batedeira de bolo da minha mãe. Ganhei um Palio dos meus pais, que penhorei por diversas vezes, por causa de dívidas com traficantes. Acabei vendendo para quitar o que devia ao tráfico. Ultimamente, estava trabalhando como office boy para meu pai, que tentou me ajudar dessa forma.
Que problemas a droga já lhe causou?
Às vezes consumia drogas e não conseguia voltar para o minha casa. Certa vez fiquei três dias perambulando ao relento, como um mendigo, sem comer, passando sede e frio. Mas nunca tinha ido parar numa delegacia.
Você sabia que pode pegar de 12 a 30 anos de prisão por tentativa de homicídio qualificado (por motivo fútil)?
Agora sei que vou ter que assumir as consequências. Só estou pensando na saúde dos meus pais no momento.
Quando encontrar com sua mãe, o que pretende dizer a ela?
Não sei nem o que dizer à minha mãe . Só quero abraçá-la, pedir desculpas. Dizer que não fui eu que fiz esse mal a ela. Não tenho coragem de maltratar ninguém, muito menos minha mãe.
Foto: Arte O Dia
Pai foi com filho pagar dívida com traficantes
Em depoimento na 19ª DP (Tijuca), o advogado José Roberto Vicente de Oliveira contou o drama que passou no domingo. Segundo ele, no meio da tarde, o rapaz ligou pedindo R$ 35, que seriam o complemento de R$ 60 para pagar um traficante no Morro do São Carlos, no Estácio, com quem havia comprado papelotes de cocaína.
“Dei o dinheiro e ainda o levei ao morro para que pagasse a dívida”, contou José Roberto. Já de volta ao apartamento da família, o advogado disse que conversou com o filho, alertando-o para a necessidade de uma nova internação, na tentativa de ajudá-lo a se livrar do vício. “Em seguida, o deixei jogando videogame no quarto. Pouco depois, ouvi os gritos de Iracema pedindo socorro”, afirmou.
Diante do filho armado com uma pequena faca de cozinha, José Roberto disse que tentou ajudar a mulher, mas acabou sofrendo ferimentos nos braços também. Vizinhos acionaram a PM, que prendeu o jovem em flagrante. A mãe do rapaz passou por cirurgias para conter hemorragias, está sedada e respira com ajuda de aparelhos.
Arrependimento e grave depressão
Especialista no tratamento a usuários de drogas, o psiquiatra Gabriel Bronstein afirma que o arrependimento também é comum em situações como a de José Roberto Júnior. “Ele pode não ser psicopata, que mata por matar. Mas talvez teve um surto psicótico, que não é obrigatório, mas acontece com usuários de cocaína”, avalia.
Maria Tereza de Aquino, do Núcleo de Estudos e Pesquisas em Atenção ao Uso de Drogas (Nepad) da Uerj, concorda: “Pelo que deduzo, ele não é psicopata. E o remorso, com a crise de abstenção, pode levá-lo à grave depressão”, avalia ela, que lamenta o baixo número de centros públicos para tratamento da dependência química na capital.
Na avaliação de Gabriel Bronstein, agora que o jovem está preso, uma das preocupações das autoridades deverá ser em manter uma vigilância constante sobre ele. Motivo: afastar o risco de que o rapaz tente o suicídio. “Essa é a conduta mais comum nesses casos, por isso ele deve ser colocado numa cela bem protegida, sem nenhum material que possa usar como instrumento para se matar”.
Poucos centros públicos para tratamento do vício
A cidade do Rio só tem dois Centros de Atenção Psicossocial Álcool-Drogas (CAPS-AD) da prefeitura e um do governo estadual, além de 70 ambulatórios na rede municipal e 200 leitos em clínicas conveniadas com o estado. No Telessaúde (3523-4025) é possível obter endereços.
Por mês, cerca de 600 usuários são atendidos nos dois centros municipais. A abstinência total dos pacientes atinge apenas 30%. Na rede estadual, a Secretaria de Saúde não informou percentual, mas ressalta que o índice de abandono do tratamento por parte dos pacientes é alto.
Os dependentes químicos recebem gratuitamente os mesmos medicamentos ministrados em consultórios de psiquiatria e suas famílias participam de todas as etapas do tratamento.
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